sábado, agosto 11, 2012

VEJA: CACHOEIRA DE CRIMES



CartaCapital No. 710

O triste fim de Policarpo
A relação do diretor da sucursal de Veja com a quadrilha do bicheiro Carlos Cachoeira era bem mais profunda do que se pensava, revelam gravações da PF

Na próxima terça-feira 14, o deputado Dr. Rosinha, do PT do Paraná, irá ao plenário da CPI do Cachoeira para fazer o que ninguém teve coragem até agora: enfrentar a mídia. Com base em um documento preparado a partir de todo o material enviado à comissão pela Polícia Federal, o parlamentar vai apresentar um requerimento de convocação do jornalista Policarpo Jr., diretor da revista Veja em Brasília. Não será um pedido qualquer. O parlamentar tem em mãos um quadro completo das ligações escusasdo jornalista e da semanal da Editora Abril com a quadrilha do bicheiro Carlinhos Cachoeira. Um relicário de quase uma centena de interceptações telefônicas feitas pela Polícia Federal nas operações Vegas, de 2009, e Monte Carlo, realizada em 29 de fevereiro deste ano.

A conclusão é devastadora.
Da encomenda de um grampo ilegal contra um deputado federal à subordinação da sucursal de Veja ao esquema criminoso de Cachoeira, as informações repassadas à CPI revelam uma ligação pessoal ostensiva entre o repórter e o bicheiro.

A avaliação de mais de cem páginas preparada para o deputado, à qual CartaCapital teve acesso, demonstra como Cachoeira fornecia fotos, vídeos, grampos e informações privilegiadas do mundo político e empresarial ao jornalista. O bicheiro usava, sem nenhum escrúpulo, a relação íntima que mantinha com Policarpo Jr. para plantar notícias contra inimigos. Em contrapartida, a revista protegia políticos ligados a ele e deixava, simplesmente, de publicar denúncias que poderiam prejudiciar os interesse da quadrilha.
As interceptações da PF porvam o que a revista nega desde o primeiro momento em que teve seu nome ligado ao do bicheiro.

Não se trata simplesmente do ecumênico trabalho jornalístico em busca da notícia que obriga repórteres a se relacionarem com anjos e bandidos, gregos e troianos. É algo muito mais profundo, uma ligação na qual os interesses “comerciais” do contraventor estavam umbilicalmente ligados aos interesses políticos da revista, a ponto de estimular uma cobertura seletiva e levar a publicação a promover ostensivamente um político, o senador Demóstenes Torres, que colocou seu mandato a serviço da bandidagem.
Cachoeira costumava escalar a dupla de arapongas Jairo Martins e Idalberto Matias de Araújo, o Dadá, para levantar informações e negociá-las com a revista Veja. O jornalista, por sua vez, mantinha encontros periódicos com o bicheiro e alguns de seus capangas, a fim de confirmar, encomendar e reunir informações para reportagens da revista.

As informações da PF com o histórico de textos publicados pelo semanário demonstram que Policarpo Jr. tinha conhecimento do funcionamento da quadrilha e usufruía dos metódos ilegais de captação de informações.
O objetivo básico dessa relação era manter o fluxo de informações para a revista contra alvos específicos. Em troca, Policarpo Jr. informava o grupo de Cachoeira sobre o que seria publicado, uma sinergia viciante iniciada em 2004 e, ao longo dos últimos oito anos, transformada numa relação de dependência mútua sem a qual esse inédito esquema de crime organizado não teria se concretizado. Nem Cachoeira teria o poder que chegou a ter nem Veja teria as informações, quase nunca embasadas em provas reais, para produzir escândalos.
Há um momento crucial em que a participação de Policarpo Jr. no esquema criminoso tornou-se inquestionável, impossível de ser interpretada como mera relação entre um jornalista e sua fonte. Em 26 de julho de 2011, uma terça-feira, uma interceptação telefônica flagrou uma conversa entre o repórter e o bicheiro. Sem mais delongas, o jornalista pede ao contraventor para grampear um parlamentar da base governista.
Policarpo Junior: É o seguinte, não, eu queria te pedir uma dica, você pode falar?
Carlinhos Cachoeira: Pode falar.
PJ: Como é que eu levanto umas ligações aí do Jovair Arantes, deputado?
CC: Vamos ver, uai. Pra quando, que dia?
PJ: De imediato, com a turma da Conab.
Em suma, o diretor da sucursal de Veja queria saber com quem o deputado Jovair Arantes, do PTB de Goiás, andava conversando ao telefone entre os dirigentes da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), ligada ao Ministério da Agricultura. Para tal missão, segundo a íntegra do áudio, Cachoeira avisou que iria destacar “Neguinho”, apelido do delegado da Polícia Federal Deuselino Valadares, informante da quadrilha preso durante a Operação Monte Carlo. Ou seja, Policarpo Jr. não apenas sabia das atividades de arapongagem clandestina do bicheiro como fazia encomendas específicas para alimentar o noticiário de Veja.
Três dias depois, em 29 de julho de 2011, outro grampo detectou uma conversa entre um certo “Paulo Abreu” e Jairo Martins. Como jamais apareceu em outra interceptação, “Paulo”deve ser Cláudio Abreu, ex-diretor da Delta Construções no Centro-Oeste. No áudio, o araponga avisa a Abreu que, naquela semana, a revista da Abril iria sair com uma reportagem sobre a Conab. Diz ainda que Veja iria “bater” em seis diretores do órgão. Informação realmente de primeira: no mesmo dia, a revista estampou uma entrevista com Oscar Jucá Neto, o Jucazinho, irmão do senador Romero Jucá (PMDB-RR), então líder do governo no Senado.
Ex-diretor-fiananceiro da Conab, Jucá Neto havia sido demitido na semana anterior por supostamente ter autorizado o pagamento de 8 milhões de reais a uma empresa fantasma, segundo denúncia veiculada pela própria Veja. Na nova edição da revista, Jucazinho destilou fel contra a Conab e acusou o então ministro da Agricultura, Wagner Rossi, do PMDB, de comandar um esquema de corrupção na pasta. Rossi seria demitido um mês depois.
Só no meio da reportagem é possível compreender o interesse de Policarpo Jr. no deputado Jovair Arantes, então líder do PTB na Câmara. O parlamentar aparece como beneficiário de dinheiro de campanha doado pela Caramuru, de Goiás, uma das maiores empresas de armazenagem de grãos do País. A companhia estaria negociando o recebimento irregular de uma dívida de 20 milhões de reais por parte da Conab, em troca de distribuir 5 milhões de reais em propinas entre os diretores do órgão, segundo Jucazinho. A reportagem da revista não trouxe, porém, uma única prova para sustentar as declarações do ex-diretor da Conab, muito menos para incluir Arantes como parte das supostas negociações de propina com a Caramuru. Ao que parece, ou a encomenda de Poliucarpo Jr. não foi entregue a tempo ou o delegado Deuselino Valadares não fez o dever de casa. O deputado do PTB goiano acabou envolvido na Operação Monte Carlo por outro caminho. Arantes foi flagrado em grampos da PF quando negociava dinheiro de campanha com Cachoeira em troca de apoio ao projeto de legalização do jogo no Brasil.
O marco inicial da relação do bicheiro e do jornalista, a quem Cachoeira e alguns capangas chamavam eventualmente de “Poli”, “PJ” ou “Junior”, pode ser determinado em 22 de fevereiro de 2005. Naquela data, Policarpo Jr. foi depor de forma voluntária no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados e defendeu Cachoeira. O depoimento serviu para vitimizar e inocentar o bicheiro de suas ligações espúrias com o Congresso Nacional. À época, o contraventor alegou ter sido chantageado pelo ex-deputado André Luiz (PMDB-RJ). O parlamentar teria exigido propina para não incluí-lo no relatório final da CPI da Loterj, a conturbada estatal de loterias do Rio de Janeiro.
Segundo Cachoeira, André Luiz havia pedido 4 milhões de reais, mas queria um adiantamento de 200 mil para pagar dívidas de campanha de um filho. O bicheiro gravou a conversa, pegou um laudo do perito paulista Ricardo Molina e deu para Policarpo Jr. produzir uma reportagem. A reportagem de Veja, intitulada “Vende-se uma CPI” foi publicada em 27 de outubro de 2004.
No depoimento que deu à Comissão de Ëtica da Câmara, Policarpo Jr. afirmou ter sido procurado por Cachoeira porque este, segundo ele, tinha interesse em conversar com um veículo “independente” e com um jornalista de “boas referências”.
A gratidão do bicheiro não tardaria a se manifestar. Em maio de 2005, por meio de um trabalho de arapongagem de Jairo Martins, então diretor dos Correios indicado pelo PTB, recebia propina para facilitar licitações na estatal. A denúncia levaria o deputado Roberto Jefferson a denunciar a existência do chamado “mensalão”.
Em 22 de março deste ano, em entrevista à mídia, o ex-prefeito de Anápolis (GO) Ernani de Paula jogou um pouco de luz nessa trama. Segundo ele, em 2003, Demóstenes Torres, senador cassado recentemente, era cotado para ssumir a Secretaria Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça. Para tal, precisaria migrar do DEM para o PMDB, partido da base aliada. O movimento iria permitir ainda que a ex-mulher de Ernani de Paula, suplente de Torres, ganhasse um mandato no Senado. O ex-prefeito diz ter convicção de que o flagrante a Marinho nos Correios foi armado por Cachoeira e Demóstenes para atingir o então ministro José Dirceu.
Hoje se sabe que os planos de Cachoeira dependiam da construção da imagem de Demóstenes, preposto da quadrilha no Senado, como paladino da moralidade pública. A partir desse personagem, falso como uma nota de 3 reais, o bicheiro conseguiu agregar apoio na mídia. A participação de Veja foi fundamental. “Não há dúvidas de que o mito de Demóstenes foi construído na Veja e replicado pelo resto da mídia”, avalia Dr. Rosinha.
Aos poucos, foi possível a PF mapear, desde 2009, por meio da Operação Vegas, como se construiu a curiosa disputa entre Cachoeira e Demóstenes pela atenção e a amizade de Policarpo Jr. Estrategicamente, a revista cuidou de consolidar a relação com o bicheiro por meio de reportagens laudatórias sobre o senador do DEM.
A mais marcante foi publicada em 4 de julho de 2007. Intitulada “Os mosqueteiros da ética”, trazia uma série de parlamentares que supostamente representariam a defesa dos valores republicanos e democráticos no Congresso contra as torpezas e a corrupção. Demóstenes era um dos destaques. O ex-senador ainda iria brilhar em uma entrevista nas páginas amarelas da revista, na qual foi vendido como o escolhido do povo brasileiro na luta contra a corrupção.
As informações passadas à CPI demonstram que Cachoeira e Demóstenes eram consultados antes de notícias serem publicadas, não se sabe se com ou sem a autorização da redação de Veja em São Paulo. Também atuavam para impedir a publicação de notícias consideradas prejudiciais à quadrilha.
Em uma conversa gravada em 13 de maio de 2009, Demóstenes pede a Cachoeira para convencer Plicarpo Jr. a entrevistar o delegado Aredes Correia Pires, então coregedor-geral de Segurança Pública de Goiás no governo de Marconi Perillo, do PSDB. Pires havia sido subordinado do ex-senador do DEM na Secretaria de segurança Pública. “Ele (Policarpo) é de confiança, você sabe que ele nunca furou com a gente”, inisite Demóstenes. O bicheiro promete tentar resolver o problema.
Em outro grampo, de 19 de maio de 2009, Demóstenes se desespera com a possiblidade de Policarpo Jr., por ter sido desprezado pelo Delegado, se voltar contra a quadrilha. “Poli me ligou dizendo que vai estourar o diretor-geral aí (o corregedro-geral Aredes Pires)”, choraminga o ex-senador a Cachoeira. Em seguida, pede para o bicheiro conseguir “umas fotos”para calar a boca do jornalista. “Mas pelo menos as fotos vê se consegue, senão (Policarpo) acaba arrancando a cabeça do Aredes, e fica a pior situação do mundo”. A PF não identificou de quais fotos o ex-senador e o bicheiro falavam, mas a estratégia deu certo. Veja nunca publicou qualquer denúncia contra o delegado Pires, mais tarde apontado pela Monte Carlo como informante da quadrilha.
Entre os dias 9 e 16 de maio de 2011, a PF flagrou outro conjunto de conversas que revelam a articulação de Cachoeira e Abreu para evitar a publicação de reportagens sobre a suposta ligação da Delta com o governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, do PT. Obviamente, para preservar a empreiteira de Fernando Cavendish. Como pode ser verificado na interceptação de 9 de maio, Abreu conta a Cachoeira que Cavendish “já tem um discurso” para resolver a crise e revela que estão todos satisfeitos com a atuação de Demóstenes no Senado. O bicheiro avisa que vai encontrar o diretor de Veja em “20 minutinhos” no prédio da empreiteira para resolver a questão.
Em um grampo de 10 de maio de 2011, Cachoeira conversa com Abreu sobre um almoço que teve com Policarpo Jr. para tratar de um suposto encontro, em Itajubá (MG), de José Dirceu com Cavendish. O encontro teria sido intermediado pelo ex-governador do DF José Roberto Arruda, defenestrado do cargo por denúncia de corrupção.
Cachoeira diz a Abreu que a fonte é “furada” e garante que o assunto vai morrer na revista. “O Plicarpo confia muito em mim”, diz o bicheiro. “Vou te mostrar a mensagem que ele passou para mim antes, 10 horas da manhã, pra eu me encontrar com ele aqui em Brasília”. A confiança de Policarpo Jr., neste caso, mostrou-se mesmo inabalável. Nada saiu a respeito do suposto encontro.
Em conversa interceptada em 16 de maio de 2011, Demóstenes comemora aliviado o recuo de Policarpo Jr. em relação ao tema. “Morreu o assunto, né? Tranquilo. Então, beleza, isso aí resolveu, então, 100% resolvido”, diz a Cachoeira. O bicheiro esclarece: “Foi a conversa que eu o Cláudio (Abreu) tivemos lá com o Policarpo. Foi bom demais, valeu”.
Em outra conversa, ainda em 10 de maio de 2011, Cachoeira conta a Abreu, em linguagem chula, como fez para convencer o jornalista a não publicar nada contra a Delta. “Enfiei tudo no rabo do Pagot! Aquela hora, Policarpo estava na minha frente”. Em seguida, dá a dica definitiva ao diretor da Delta de como se comportar nesses casos: “Você me fala, então, depois, porque por fora eu posso ajudar demais plantando em cima dele (Policarpo), igual plantei do Pagot naquela hora. Ele anotou tudo, viu? Uma beleza. Pagot tá fodido com ele”.
E estava mesmo. Luiz Antonio Pagot, ex-diretor geral do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), do Ministério dos Transportes, foi demitido dois meses depois da conversa entre o bicheiro e o repórter. Exatos 26 dias após o almoço, Veja denunciaria um suposto esquema de cobrança de propinas para beneficiar o Partido da República (PR) nos contratos do Dnit.
A partir da Monte Carlo e das revelações nos diálogos entre Cachoeira e Policarpo Jr. foi possível descobrir o que realmente ocorreu. Pagot pode até não ser um beato, mas sua queda tem mais a ver com o fato de ele ter contrariado interesses da Delta e da quadrilha. O ex-diretor cometeu o erro de criar problemas para a construtora em licitações. Em uma delas, por exemplo, a Delta foi investigada pelo Dnit por ter subcontratado uma empresa para obras de recuperação de um trecho de 18 quilômetros da BR-116, no Ceará, sem autorização para tal.
Em uma conversa captada pela PF em 20 de março de 2011, Cachoeira revela a Demóstenes que Policarpo jr. teria censurado uma entrevista feita em setembro de 2010, véspera das eleições, por Diego Escosteguy, então repórter da sucursal. Na entrevista, Arruda, o ex-governador cassado por corrupção, envolvia figurões nacionais do DEM e do PSDB no esquema de propinas no Distrito Federal. A entrevista só seria publicada em 18 de março de 2011, mas pela concorrente Época, para onde Escosteguy se transferira.
Ainda assim, o diretor de Veja tentou dar uma rasteira no ex-subordinado. Na quinta-feira anterior à publicação da entrevista em Época, Policarpo Jr. vazou diversos trechos da entrevista para o site da semanal da Abril na internet. Uma tentativa pueril de atingir a concorrência e, principalmente, de tentar camuflar a censura anterior. “O Policarpo ajudou também, viu? Ia foder todo mundo. Mas você viu que ele ficou com medo e recuou. Tenho certeza que recuou por causa do seu nome”, revelou o bicheiro, para a satisfação do ex-senador do DEM.
Dono da situação, Cachoeira passou a pautar todo tipo de reportagem, a fim de favorecer os negócios da Delta. Em um grampo de 29 de junho de 2011, o bicheiro conversa sobre uma notícia encomendada a Veja por Abreu. Tratava-se de uma reunião de 70 construtoras da Associação Nacional das Empresas de Obras Rodoviárias (Aneor) para encaminhar a licitação de uma obra na BR-280, em Santa Catarina. A reunião, marcada para acontecer em Curitiba, segundo Cachoeira, seria em 1˚ de julho de 2011.
O evento era um prato cheio. Naquela mesma semana, a sucursal de Brasília preparava uma reportagem sobre supostos esquemas de corrupção no Ministério dos Transportes. Os alvos eram o então titular da pasta, Alfredo Nascimento, presidente do PR, e Pagot. Em uma conversa captada pela PF, Cachoeira e Abreu combinam a infiltração de alguém da revista na reunião e a retirada estratégica dos representantes da Delta do evento. O bicheiro e o diretor da empreiteira mal conseguem se segurar de tanta excitação:
Carlinhos Cachoeira: Teve com Policarpo?
Claúdio Abreu: Cara, show de bola, achei que ele ia beijar a minha boca!
Em seguida, traçam a estratégia de infiltração de um repórter, de preferência Policarpo Junior:
Abreu: Já mandei o pessoal da Delta sair, né? Que nós não vamos participar da obra. Então falei para eles não ir (sic) lá. Ele (Policarpo) vai lá. Falou: “Tem jeito de entrar?”. Falei: “Tem, cara, você infiltra lá e grava a conversa, o sorteio, vão sortear duas obras”. Ele tem de falar que é de uma empreiteira. Talvez dar caução.
Cachoeira: Ele vai fazer o trem? Vai tá lá?
Abreu: Falou que ia mandar gente.
No dia seguinte, 30 de junho, Cachoeira se apressa em ligar para Demóstenes para contar sobre a reunião da Aneor, em Curitiba. “Passei um trem para Policarpo aí hoje, que ele vai bumburrar, viu?”, conta o bicheiro ao ex-senador do DEM. “Só guarde para nós aí, que ele vai infiltrar lá”. Demóstenes não se contém: “Show de bola, show de bola! Aí vai ser um show mesmo, aí é supercraque, hein? Aí vai ser de derrubar”. Cachoeira dá os últimos detalhes e pede sigilo sobre a operação. “Não comenta com ninguém não, ele vai com filmadora e tudo”.
A reportagem “O mensalão do PR” gerou uma crise imediata na cúpula do Ministério dos Transportes, mas não conseguiu derrubar o Ministro Alfredo Nascimento. Um dia depois, em 2 de julho de 2011, Cachoeira voltou a conversar com Abreu para falar da repercussão.
Abreu: Rapaz, o (Policarpo) Junior, o amigo nosso de Brasília, é mais forte que Aldrin 40 (agrotóxico inseticida). Você chegou a ler a matéria dele hoje, não é?
Cachoeira: Não. O que ele falou? Foi boa?
Abreu: Agora, às 15 horas e 12 minutos, a presidente Dilma Rousseff convoca o Ministro dos Transportes e manda afastar todos os citados na reportagem de Veja”. Entra no site do UOL que você vai ver. A matéria ficou boa pra caralho, ele citou a reunião (da Aneor, em Curitiba), cara.
Cachoeira: Você é forte também, hein, Cláudio!
Abreu: Você é que é forte, amigo. Ainda bem que sou seu amigo. Eu já mandei uma mensagem para ele (Policarpo), manda uma pra ele. Ele tem um Viber (aplicativo de mensagens para celular), manda um Viber pra ele. Eu botei assim: “Sua matéria já deu repercussão, você é mais forte que Aldrin 40”. Ele respondeu: “Já? Já teve repercussão?”Falei: “Veja o site do UOL”. Falou: “Vou ver. Abraço”.
Um dia após a saída de Nascimento, dos Transportes, em 7 de julho de 2011, Cachoeira falava como se fosse chefe de Policarpo Jr. Naquele dia, o bicheiro iniciou um forte lobby para promover um apadrinhado político instalado no governo de Perillo, o secretário estadual de Educação, Thiago Peixoto. Em mais uma conversa interceptada pela PF, Cachoeira diz a Abreu: “Você está com Policarpo Junior? Fala pra ele fazer uma reportagem aí. O Thiago tá fazendo uma revolução na educação aqui. Manda ele designar um repórter pra cobrir”
Havia um interesse comercial. Em uma conversa de 9 de junho de 2011, Cachoeira fala com um comparsa da quadrilha, Gleyb Ferreira da Cruz, sobre um projeto de construção de escolas de baixo custo em Goiás. “Comenta com ninguém não, mas o Thiago (Peixoto, secretário de Educação) passou o modelo pra nós, tá? Vai alugar várias escolas no estado, entendeu? E vamos construir, porque na hora que sair (a licitação), tá pronta, é só oferecer”, diz o bicheiro. Em dezembro do mesmo ano, a capa de Veja seria inspirada em um projeto de educação “de qualidade e baixo custo” na China.
Não foi surpresa nenhuma para a PF e para a CPI, portanto, quando há 15 dias a mulher de Cachoeira, Andressa Mendonça, tentou chantagear o juiz federal Alderico Rocha Santos com um dossiê, segundo ela produzido por Veja. Andressa teria dito, contou o juiz: “O senhor conhece Policarpo Junior? O Carlos (Cachoeira) contratou o Policarpo para fazer um dossiê contra o senhor. Se o senhor soltar o Carlos, não vamos soltar o dossiê”.
O bicheiro continua preso e Andressa teve de pagar uma fiança de 100 mil reais para não acabar no xadrez.